Acredito que todo o mundo, literalmente, vem acompanhando, de uma forma ou de outra, as primeiras aventuras do presidente americano Donald Trump. Entre frases e imagens de efeito para a mídia, Trump vem tomando decisões que afetam diretamente as melhores práticas das relações entre pessoas, atacando frontalmente aquilo que convencionou-se chamar de direitos humanos. As medidas de construção do muro entre os vizinhos EUA e México assim como a proibição de estrangeiros de países muçulmanos entrarem na terra do Tio Sam são os piores exemplos disso.
E o que isso tem a ver com este espaço de empreendedorismo e inovação? Na minha opinião é nesse momento que as empresas e as marcas podem revelar (ou não) o seu propósito. Pois um negócio precisa, antes de tudo, cumprir uma função social. É dessa contribuição que a empresa faz para sua comunidade que vem a admiração de seus clientes, empregados e acionistas. O lucro pode ser uma consequência desse posicionamento – e não apenas uma busca a qualquer preço. E a recente falta de habilidade (para ser discreto) do presidente americano na condução de suas políticas externas vem dando oportunidade para que as empresas mostrem um pouco do seu caráter e dos seus valores. E gostaria de ilustrar esse raciocínio com dois exemplos.
O primeiro deles vem do Uber, que vem perdendo milhares de clientes, principalmente nos Estados Unidos, depois de um tweet postado pela conta da companhia em Nova York, quando a companhia declarou que suspendeu a tarifa dinâmica na região do aeroporto JFK (conforme imagem abaixo).
A questão é que os taxistas de Nova York, nessa mesma hora, tinham programado uma “paralisação” de uma hora nos serviços em protesto contra a decisão do presidente americano (como muitos sabem, milhares de taxistas nos EUA são imigrantes) e o Uber decidiu não apoiar de imediato a ação. O tweet foi interpretado como um apoio às medidas do presidente americano, ainda mais que o CEO e fundador da empresa é um dos conselheiros do novo presidente americano. Imediatamente a revolta tomou conta dos usuários nas redes sociais que criaram a hashtag #deleteuber, como forma de convidar os clientes a boicotarem a empresa.
A questão é polêmica, pois a empresa alega que não quis de nenhuma forma boicotar o protesto, apenas garantir o direito dos nova-iorquinos de se locomoverem, mesmo durante esse período. Uma das evidências de que a empresa não estaria apoiando a decisão do presidente americano é a carta publicada mais ou menos na mesma hora pelo CEO da companhia, Travis Kalanick, no seu Facebook, onde mostra a empresa preocupada com a situação das famílias de motoristas afetados pela medida, como pode ser visto no post que está aqui. Horas, depois, diante de tanta polêmica, a empresa decidiu anunciar que reservou até 3 milhões de dólares para ajudar as famílias de motoristas eventualmente prejudicados pela medida.
Já mexicana Corona, quinta marca de cerveja mais vendida nos Estados Unidos, optou por tomar partido de forma muito mais transparente. Em resposta a uma das frases símbolos do governo Trump desde sua posse – Make America Great Again – onde o magnata apela para o nacionalismo americano para justificar suas decisões (dentre elas a construção do muro gigante separando de forma física a fronteira dos EUA e do México), lançou a campanha “Somos Todos America”, onde prega um continente unido, que é rico por sua mistura e diversidade – e não pelo separatismo. A campanha é ainda mais evidente quando defende o “Desfronteirismo”, convocando publicamente a população a revoltar-se contra o muro.
Na antiguidade, os romanos costumavam dar nomes aos ventos. E um vento em especial era muito apreciado, “ob portus”, o vento que te leva ao porto. É daí que vem a palavra oportunidade, o vento que dá a oportunidade de te levar ao porto. Acredito que diante desse momento tão importante em que o mundo é obrigado a discutir valores, é a oportunidade das marcas e empresas ajustarem as velas, tomarem partido e aproveitar os ventos das mudanças para mostrarem a que propósito servem.
Fonte da foto de destaque – https://flic.kr/p/nTkLzE (Creative Commons)
Por Marcelo Pimenta (Menta90). Jornalista, professor e criador do blog Mentalidades.
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