O artigo de hoje é inspirado na minha conversa com a Clarissa Biolchini, especialista em processos de inovação guiados pelo design. Vamos começar citando um exemplo de como o pensamento baseado no design – ou, o design thinking – pode transformar a experiência dos clientes de forma positiva. “Fui a Amsterdã ano passado. Peguei um voo da KLM e, na hora de fazer checkin, vi que é tudo automatizado. Você passa seu cartão, coloca sua mala numa caixa e o sistema vai lendo seus dados. Ou seja, ali é tudo pensado a partir do ponto de vista do design, satisfazendo a necessidade, por exemplo, da segurança, de você ver sua mala ir embora, ver para onde ela vai. Isso foi uma coisa que me impressionou, porque você não precisa mais falar com ninguém, é só colocar sua mala ali, despachar a bagagem, receber seu cartão. Tem um funcionário que ajuda se algo der errado, mas todo o processo é automatizado”, conta Biolchini, que também é designer.
Inovações como essa são possíveis graças ao que chamamos de visão centrada no usuário, uma das pontas que formam o triângulo do design. As outras duas pontas são tecnologia e visão do negócio. Como explica Clarissa, é um triângulo porque não adianta você partir de uma ponta só, você precisa criar uma solução que una as três pontas. É a partir desses pilares que podemos chegar a soluções para as mais variadas questões, inclusive para o seu empreendimento.
De acordo com Marty Neumeier, design é a disciplina ou processo de mudança de uma situação existente para uma situação desejada. Essa disciplina nos ajuda a avaliar uma situação de forma mais ampla, e, com essa perspectiva, pensar na trajetória até a solução. Para Biolchini, o Design é a forma de resolver problemas que faz mais sentido, porque une o pensamento analítico e o pensamento criativo. É por isso que o design tem ultrapassado seu campo tradicional de atuação (para designers, apenas), sendo aplicado em outros segmentos.
Empreendedorismo e design
A disciplina design é complexa, mas oferece conceitos e ferramentas interessantes para empreendedores, principalmente quando consideramos o mercado atual, que está sempre mudando. Assim, faz diferença adotar uma abordagem prática, rápida, centrada nas pessoas e intuitiva – em outras palavras, baseada no Design. Clarissa lembra que, obviamente, um empreendedor deve ter afinidade e interesse em seu ramo de atuação. Mas, para abrir qualquer negócio hoje, olhando como um designer, o melhor é partir das necessidades das pessoas, e não apenas de uma nova tecnologia disponível. Também não é muito promissor enfatizar o lado comercial: abrir uma empresa porque surgiu um investidor, ou porque você acha que existe uma demanda por determinado produto. Ao contrário, o olhar do designer quer, primeiro, fazer uma pesquisa para saber o que as pessoas desejam e de que elas necessitam; a partir das respostas, é possível gerar hipóteses e criar produtos que satisfaçam estes desejos e necessidades.
Dessa forma, “você entende quem é seu público-alvo. A partir do momento em que você tem seu negócio girando, usar o design é muito importante para a resolução de problemas, ele tem técnicas para isso. E o design thinking como abordagem permite que você resolva problemas de qualquer instância numa empresa, desde um problema de marketing até organizacional. Como o mercado está sempre mudando e a revolução digital tem crescimento exponencial, esse desafio se torna cada vez mais latente. Usar a mentalidade do design, hoje, dentro dos negócios, para mim é fundamental”, completa Clarissa Biolchini.
Todo empreendedor deve se tornar um designer
Na verdade, todo empreendedor pode se apoderar da forma de pensar que vem do design. Eu mesmo sou um exemplo de que profissionais de outras áreas podem se apropriar do pensamento, da visão de um designer para solucionar problemas, seja nos negócios ou na vida pessoal. Claro que eu mesmo não me tornei um designer no sentido literal, porém, por mais que não tenha habilidade como designer gráfico, designer de produto, tenho aprimorado o design thinking com a prática. E a Clarissa partilha desta mesma ideia. “Não é que todo mundo vai virar designer, mas o meu trabalho hoje é trazer essa abordagem. Ajudar as pessoas a pensar como designers é uma tendência e tem sido muito interessante, porque é como se a gente estivesse abrindo a metodologia para todo mundo. Então, treinamos, damos capacitação, e as pessoas saem dali com uma linha nova que gira na cabeça delas, mas, para que consigam se apoderar daquilo, demora. Na verdade, o design é uma disciplina que exige prática. Você pode ler todos os livros, ver todos os filmes do mundo sobre design, mas você só vai se tornar um designer quando começar a praticar, a colocar a mão na massa. Claro que tem todo um embasamento teórico, existem estudos dentro da Academia, mas é prática. Se você não pratica, você não consegue”, explica ela.
Design e Liderança Criativa
Nas palavras da Clarissa, “a liderança criativa é complementar à visão do design. O design está se abrindo para as pessoas, porque o mundo está precisando disso. Tem a ver com mudança de cultura, com tecnologia, com um olhar mais humanizado, que a gente precisa ter. Isso impacta não só as empresas, mas a vida das pessoas. Uma nova vertente hoje é o design organizacional, que tem a ver com formar equipes de acordo com as necessidades do mercado. É aí que entra a liderança criativa, necessária dentro das empresas, também, e ela tem algumas vertentes. Líderes criativos precisam ter uma visão de negócios e, ao mesmo tempo, uma forma de pensar mais intuitiva e mais criativa. Precisamos de líderes criativos nas instituições, nas organizações de qualquer instância atualmente.”
O design também pode ser útil na vida pessoal
O design thinking pode ajudar a pensar soluções para qualquer tipo de problema. Clarissa, inclusive, é referência no assunto: ela é mãe, esposa, professora do curso de pós-graduação em Design na PUC-Rio, desenvolve inúmeros projetos em paralelo, a exemplo do prefácio do livro “Isto é Design Thinking de Serviços” de Marc Stickdorn. Ela usa o design para conciliar tudo isso. “Funciona da seguinte forma: quando tenho um problema, eu paro e desenho. Faço um mapa mental da situação e das possíveis soluções. Claro que não faço um processo inteiro, mas uso recursos visuais para enxergar a situação. Então, na minha casa e no meu trabalho, nas paredes, tem sempre coisas coladas, tem mapas. É o pensamento visual que me ajuda a formular uma visão macro do que é aquilo, ou respostas. Eu uso dessa forma. São como protótipos, você cria uma solução para algo e aí você testa; se não dá certo, você tenta outra solução, até conseguir. Eu uso [o design] de uma forma fluida, criativa e visual. Eu trago, também para os meus filhos, essa visão: sempre que tem um problema, desenha, tenta entender o que está acontecendo. Tenho um quadro na minha casa, onde deixamos recados e desenhos. Temos tinta e papel sempre à mão”, responde ela.
Gostou do artigo? Assista a entrevista completa, disponível neste link: https://www.youtube.com/watch?v=uYyhOcP73BQ
Por Marcelo Pimenta (Menta90). Jornalista, professor e criador do blog Mentalidades.
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