Marcelo Pimenta

Comércio eletrônico exige MUITO conhecimento e dedicação

Abrir uma loja virtual parece fácil, mas não é. Requer múltiplas competências e contínua atualização

Esta semana recebi contato de uma leitora querendo minha opinião sobre abrir uma loja online para vender artigos de decoração “descolados”.  Ela atua como arquiteta num escritório, mas para enfrentar a crise, quer “diversificar” as fontes de renda e pensa em abrir seu próprio negócio. Perguntei se ela tinha conhecimento prévio no mercado de varejo de decoração – a resposta foi não, nem varejo, nem decoração. Perguntei se tinha conhecimento de tecnologia web, marketing digital, se estava por dentro do segmento, quais os principais players,  a resposta foi: não. Perguntei se ela tinha alguma credibilidade além da tradicional nesse segmento, tipo: lançou um livro, tem um blog, dá cursos, ganhou algum prêmio, a resposta também foi negativa.

Meu conselho, no rápido telefonema: comece buscando criar reputação digital e/ou a vender para seus vizinhos, amigos e familiares, de forma física. Crie uma página no Facebook bem simples para mostrar seus produtos (veja esse exemplo). Experimente “ter uma loja” grátis no mercado livre ou no OLX para “brincar”. Se você gostar mesmo, encare um período de estudo, dedicação: comece a ler os sites do assunto, faça cursos, comece a participar de eventos (nesse ponto a primeira referência é E-Commerce Brasil que reúne o melhor time de empresas e profissionais comprometidos em fazer o comércio eletrônico dar certo no país).

Depois fiquei pensando se não fui pessimista ou “negativo” demais. Refleti e cheguei à conclusão de que não, afinal, e-commerce tem uma “imagem” de ser algo simples, mas ter um e-commerce que consiga fechar as contas no final do mês é complexo e exige múltiplas competências.

– Negócio – Se você tem um e-commerce de peças de automóveis, precisa entender desse mercado. Se for de mel, precisa saber de alimentação saudável. Se for de roupas, deve entender de moda. Se for de máquinas pesadas, deve entender de engenharia, mercado de construção. Enfim, é preciso conhecer e acompanhar as tendências do segmento que pretende atuar.

– Varejo – Comércio eletrônico é uma atividade de compra e venda. O dono da loja precisa saber escolher o que oferecer, o que comprar, encontrar e qualificar seus fornecedores, definir seu catálogo de produtos, como eles estarão descritos, como serão exibidos. Definir como vai gerenciar o estoque, a entrega, toda a retaguarda do negócio atrás do balcão: o lado da cozinha que ninguém ver.  Do lado de fora (no computador ou smartphone) há um cliente. Para encantar e satisfazer esse cliente cada vez mais exigente é preciso entender de vendas, de atendimento, relacionamento, fidelização, suporte, legislação, tendências, canais, parcerias.  Antes de tudo, quem quer ter e-commerce precisa saber de vendas e varejo.

Tecnologia – O relacionamento com o cliente, a experiência de compra, o pagamento, o acompanhamento da entrega, o SAC, tudo no e-commerce, necessariamente, é software. Que roda em plataformas de hardware. Por mais que os fornecedores venham cada vez mais tentando fazer lojas amigáveis, que qualquer um possa editar, você vai precisar escolher, decidir, estar permanentemente atualizado. E estar disposto a saber que tudo está em contínua evolução – nesse caso, mais uma vez, não apenas aprender e pronto –  é preciso atualizar-se constantemente.

Marketing digital – não basta saber de tecnologia. O marketing digital exige todos os conhecimentos do marketing tradicional: branding, quatro pês, campanhas, canais, embalagem, relações públicas, assessoria de imprensa  e incorpora todo um vocabulário e conhecimento do mundo digital: métricas, conversão, SEO, ambientes responsivos, conciliação, design…. Conhecer plataformas e redes – Facebook, Twitter, Instagram, Snapchat, LinkedIn, YouTube, Vimeo … – e saber quais priorizar, porque e como – e manter essas redes vivas, gerando engajamento constante.

Logística – Não existe frete grátis. Essa é uma ilusão do consumidor, as questões de logística no comércio eletrônico são muito complexas e vão além da gestão de estoque. Existem os custos de armazenamento e transporte – que podem ser muito complexos pois podemos estar falando de perecíveis, de congelados, de joias, de obras de arte, de geladeiras. Existem os problemas de endereçamento – que se agravam quando o e-commerce começa a atingir as áreas rurais. Sem falar na logística reversa (pelo código do consumidor todo cliente pode devolver um produto comprado – e o custo de devolução desse produto é obrigação do lojista).

Finanças – vender por meios digitais exige um acompanhamento constante dos preços. E gestão e fluxo de caixa (na maioria das vezes, o prazo entre a compra da mercadoria e o efetivo recebimento da receita é de 60 a 90 dias). Além de que o custo com publicidade e aquisição de clientes no e-commerce é muito alto. E os gigantes são experts nesse tema, acompanham em tempo real as ofertas, o custo dos links patrocinados, fraudes, taxa do cartão, custo de entrega, cashback, remarketing.

Fiscal – mais recentemente a burocracia estatal vem exigindo do empreendedor uma especialização fiscal, pois a medida do Confaz (o chamado convênio ICMS 93/2015), que divide a tributação de compras pela internet entre os Estados de origem e destino da mercadoria, na prática inviabiliza a venda de produtos entre diferentes estados. A polêmica é grande e a luta contra esse absurdo vem sendo liderada pelo E-CommerceBrasil, ABComm e Sebrae (atualmente uma liminar vem suspendendo a cláusula 9 do Convênio).

Gestão – conseguir equilibrar todos esses fatores, no tempo que o cliente digital espera exige do empreendedor do comércio eletrônico muita resiliência, dedicação, atenção e força de vontade (maior do que em outros segmentos menos complexos).

Sim, o e-commerce é um segmento que mais cresce no mercado (o aumento foi de 24% em 2015, numa época que outros setores amargaram retração)– e vai continuar crescendo – os principais números estão no infográfico abaixo.

Porém, comércio eletrônico é um terreno para quem está disposto a encontrar um modelo inovador. Não há espaço para mais do mesmo. Feito isso é encarar o desafio de buscar equilibrar essas múltiplas competências, formando um time. E preparar-se para ralar muito. Já tinha escrito sobre isso em 2014, e volto a repetir: e-commerce não é fácil. Não se iluda achando que é mais é mais barato ter uma loja virtual do que física (dê uma olhada nessas estimativas de custos atualizadas para criação e manutenção de uma loja online). Mesmo que seja um caminho sem volta (os consumidores querem cada vez mais comprar online), ter uma loja online lucrativa exige do empreendedor muito mais que boas intenções – é preciso identificar um modelo que seja realmente inovador e persegui-lo com muita dedicação.

Publicado originalmente em http://blogs.pme.estadao.com.br/blog-do-empreendedor/comercio-eletronico-exige-muito-conhecimento-e-dedicacao/

Por Marcelo Pimenta (Menta90). Jornalista, professor e criador do blog Mentalidades.
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